“Nossa luta será nas ruas e nos Tribunais, iremos ocupar a cidade porque ela é nossa”
Já no limite da paciência, mulheres unidas em colectivo, maioritariamente, constituído por organizações da sociedade civil de nível nacional, pela Associação de Vendedoras do Mercado do Frango e da “Magumba”, pelas vendedoras do Mercado do Peixe e familiares das vítimas da manifestação de 14 de Julho, denunciaram na semana finda às ilegalidades das instituições que tendo o dever de as proteger, optaram por se posicionar do lado errado da história.
Mas mulheres fazem um grito de socorro e questionam as autoridades moçambicanas: “Afinal porque é que nos maltratam tanto?”. Segundo Quitéria Guirengane, Secretaria Executiva do Observatório das Mulheres (OM), os abusos perpetrados pelo Conselho Municipal de Maputo e a Policia da Republica de Moçambique são inadmissíveis. Assim sendo, mesmo sendo combatidas pelas autoridades, as mulheres afirmam que não vão recuar na busca por justiça. Prometendo ocupar a cidade e as ruas em manifestações quando for necessário.
“As infracções que hoje denunciamos constituem violações de direitos humanos de proporções alarmantes. Fazemos o apelo as autoridades e esperamos que possam agir para que nós tenhamos que subir as escadas e os níveis, e levarmos estes assuntos as instituições a nível da União Africana ou das Nações Unidas que tem o dever de zelar por estes assuntos. Nossa luta será nas ruas e nos Tribunais, iremos ocupar a cidade porque ela é nossa. De hoje ate a resolução destes problemas, iremos usar a “rasteg-socorro” contra todas as humilhações que as mulheres são submetidas, e convidamos ao cidadãos de bem a apoiar as nossas mães”, disse a Líder.
Caso das vendedoras no Mercado do Frango e da Magumba
Guirengane começou por denunciar o aproveitamento das relações de poder desiguais para sonegar o acesso a contratos assinados compulsivamente e sob intimidação. Consta que as vendedoras são cobrança de uma renda de 3,500.00 Meticais, ao que é acrescida uma taxa de mercado, cumulativamente muito distante do que lhes era cobrado na pedra antes do seu reassentamento no actual mercado. Outo problema está ligado a ausência de lavabos de serviço e o condicionamento do acesso das vendedoras e do seu pessoal à uma taxa de 5.00 Meticais por entrada. E apela-se à Inspecção Nacional das Actividades (INAE) que verifique as condições em que as mulheres trabalham no mercado e que sancione a edilidade em conformidade
“Partilham de quiosques por dois à três vendedoras porque a disponibilidade de espaço é inferior ao que foi inicialmente registado no processo de reassentamento. Há precariedade e infiltração dos quiosques, os quais quando chove impossibilitam o trabalho e provocam choques eléctricos, para além da rápida putrificação dos produtos”, disse a fonte.
As mulheres queixam-se da aparente privatização do mercado sob uma gestão estranha e não negociada da CTA, cujos representantes ilegalmente proíbem a aquisição de produtos de determinadas marcas e impõem a aquisição de produtos e serviços em seus fornecedores (lavagem de loiça, bebidas, carvão, gelo, entre outras utilidades. As mesmas exigem que a À Confederação de Associações Económicas de Moçambique “CTA” clarifique o seu papel no Mercado do Frango e da Magumba e coloque fim as alegadas más práticas que mancham o seu bom nome.
Revelou a líder que no dia 27 de Julho, foram confiscados cartões dos contadores de corrente eléctrica instalada em cada quiosque pela EDM, condicionando o acesso à energia ao pagamento directo do valor da recarga à gestão do mercado. As vendedoras querem a devolução de cartões de CREDELEC e liberação dos espaços, assim como, o fim das imposições e interferências ilegais, arbitrárias e injustas no negócio. “Há vedação irregular dos espaços extra para colocação de fogões e chaminés congestionando a confecção de alimentos ao espaço sem condições adequadas. E há ainda imposição de instituições de crédito com taxas elevadas e bloqueio do acesso à instituições bancárias mais credíveis”, destacou.
As mulheres exigem a remoção da renda e fixação pelo Conselho Municipal de uma taxa única proporcional à cobrada em outros mercados da cidade, preferencialmente de 550 meticais. Querem ainda cumprimento dos compromissos relativos a indemnização e compensação justa incluindo através de quiosques proporcionais à dimensão dos espaços expropriados e, nas condições e qualidade propostas no anteprojecto do mercado, nos termos dos direitos dos afectados consagrados pelo art. 10 Decreto 31/2012 que aprova o Regulamento sobre o Processo de Reassentamento resultante de Actividades Económicas ou do ponto 2.2.
Neste caso, destacam-se ainda a violência física contra mulheres vendedoras que se recusam a adquirir gelo comercializado pela então Administradora do Mercado, cumulativamente Vereadora Adjunta para Mercados e Feiras. No local regista-se caso de vandalização dos produtos das vendedoras sempre que não concordam com um posicionamento da administração.
“Inviabilização do direito à manifestação e requisição ilegal de força policial para intimidar as vendedoras. À Procuradoria-Geral da República que dê provimento adequado a estas queixas e avance com a investigação e instauração de procedimento criminal por (i) Desobediência qualificada promovida pela PRM e pelo Município ao impedir e interferir no livre exercício do direito à manifestação nos termos do art. 16 da lei 9/91 de 7 de Julho alterada e republicada pela lei 7/2001 de 7 de Julho”, disse Guirengane.
Caso das Mulheres Familiares das vítimas da manifestação de 14 de Julho
O Observatório das Mulheres recebeu duas solicitações de ajuda, uma da senhora Hermínina e outra da anciã Eda, pedidos de intervenção relativo ao baleamento de três cidadãos por agentes da Polícia de Protecção e da Unidade de Intervenção Rápida da Polícia no bairro Luís Cabral, no dia 14 de Julho, entre as 22 horas e a meia-noite, no período classificado pela Polícia como relativamente calmo.
Segundo Quitéria Guirengane, fontes testemunham que os autores destas ilegalidades estavam visivelmente embriagados e a descarregar sobre qualquer jovem que encontrassem pelo caminho. “Para o azar de Hermínia e Eda, dois destes jovens são seu esposo e seu filho respectivamente. Hermínia esperou pelo marido naquela noite que, tendo saído para acompanhar o irmão não voltou naquela noite porque fora confundido com um manifestante e sentenciado a pena de morte”, avançou a fonte, acrescentando que querem saber quem orientou a Polícia a balear o filho da dona Eda e seu amigo, bem como ao marido de Hermínia, instituindo em Moçambique uma pena de morte inconstitucional e uma Polícia executora imediata de penas.
Avança-se ainda dentre as acusações incorridas pelos Agentes destacam-se ofensas corporais voluntárias de que resultou impossibilidade temporária para o trabalho previsto e punido pelo art. 172ᵒ do Código Penal. Diz ainda a organização que a PRM colocou as pessoas em estado de não se poder proteger previsto no art. 219ᵒ do Código Penal, por terem abandonado os ofendidos na via pública sem prestarem nenhum tipo de socorro.
“Há tentativa de homicídio previsto nos artigos 17 e 18 conjugados com as alíneas f) e i) do art. 160ᵒ todos do Código Penal, por terem efectuado vários disparos que atingiram partes sensíveis do corpo dos ofendidos que por sorte não viraram óbitos. Houve uso abusivo de armas previsto e punido nos termos do art. 227 do Código Penal, visto que dispararam injustificadamente arma de fogo contra outra pessoa. Abuso de cargo ou função previsto pelo art. 431 do Código Penal, uma vez que usaram abusivamente a qualidade de servidores públicos para praticar actos em violação da lei”, apontou as ilegalidades.
Guirengane aponta outros desvios praticados pela polícia, como é o caso Crime continuado previsto e punido pelo art. 44 do Código Penal por depois de perpetrada o atentado contra o primeiro ofendido com omissão de socorro, potencialmente os mesmos agentes terem, pelas condições de tempo, lugar e maneira de execução, terem continuado a promover novas vítimas pelo bairro Luís Cabral. “Apelamos ao Ministério da Saúde que investigue possíveis más práticas que impossibilitaram o referenciamento de casos de baleamento protagonizadas pela Polícia à medicina legal conforme decorre do Protocolo de Atendimento Integrado à Vítimas de Violência”, exorta a líder.
Realçou a Guirengane que os cenários acima partilhados são o padrão da actuação estatal e da violência público ao nível nacional com foco para grandes centros urbanos como Nampula e Beira onde reportagens bastante testemunham um impedimento de manifestações e uma violência sistemática contra vendedoras do sector informal que precisa ser sancionada. Recordando o caso das manifestações relativas ao fundo da covid-19 e de vendedores do sector informal. A fonte avança que um trabalho de nível nacional está em curso para colher e unir essas vozes caso uma resposta adequada não seja dada às suas reclamações.
“Os testemunhos que acabamos de partilhar são vozes de mulheres que, tal como em Ndlavela e Matalana, se sentem não apenas abandonadas, mas exploradas, oprimidas e expropriadas pelas instituições que têm o dever de as proteger. São vozes de mulheres que buscam o pão para alimentar as suas famílias mas que, alguns agentes e servidores públicos se sentem no direito de ser sócios sem nenhum investimento e de enriquecerem à custa dos seus sacrifícios. São vozes de mulheres que não foram assistidas pelo Estado durante a subida do preço de transporte e nem para lidar com os efeitos adversos das medidas de resposta à COVID19, mas hoje vistas como um saco azul para financiar interesses inconfessáveis”, disse.
De acordo com a organização da sociedade civil, contrariamente ao que a Edilidade tem estado a propalar, este assunto é por si conhecido e há evidências de inúmeras reclamações devidamente registadas sob a matéria, incluindo a resistência dos vendedores no acto do reassentamento tendo para efeito adoptado a estratégia de dividir para reinar e de retirada compulsiva.
“A pergunta que fazemos é: quando o município compulsiva e recorrentemente perde expedientes sempre que um aviso de manifestação entra o que o povo deve fazer? A nossa resposta é cumprir o estabelecido no nº2 do artigo 11 da lei 9/91 de 18 de Julho alterada e republicada pela lei 7/2001 de 7 de Julho a qual estabelece que “a não notificação dos promotores da manifestação no prazo de dois dias a contar da recepção da comunicação pelas autoridades deverá ser considerada a não existência de objecção para a sua realização”, avançou a líder.
Guirengane foi mais além ao afirma que; “Então, estamos a avisar e não a pedir e, estamos a nos preparar para ir à rua em bloco para intimar a Polícia e a Edilidade para comportamento. Queremos nome e rosto para as ordens superiores que desgraçam milhares de famílias em Moçambique e alimentam as ilegalidades das instituições estatais que nos devem servir”.
O coletivo de mulheres quer ainda os nomes e rostos para as ordens superiores que decidiram que a Polícia deveria soltar cães para morder a Lurdes e Arlinda, duas vendedoras informais. “Um cão que por ser menos irracional do que os cumpridores dos comandos superiores, decidiu morder o agente material de tal decisão ilegal. Queremos saber quem mandou soltar cães contra a dona Arlinda, uma senhora com deficiência física que em 2021 ia apelar a Polícia Municipal a devolver sua bolsa de medicamentos e de documentos hospitalares que equivocadamente foi apreendida com os seus produtos de comércio, mas o cão estranhamente optou por travar a menos de um metro da vítima”, disse.
A organização revela que por tentativa de homicídio contra todas as vítimas identificadas nestes casos denunciados, sobre esta matéria fará a devida participação criminal nos próximos dias. E ainda mais espera-se que o Provedor de Justiça da República de Moçambique dê provimento justo, consciente e sensível às reclamações destes grupos socialmente desprotegidos. Por outra, a Comissão Nacional dos Direitos Humanos, que na sua missão de promover, proteger e defender os direitos humanos que inicie investigações sobre estas alegações.
Apela-se também que a Comissão Nacional de Ética Pública inicie investigações sobre possíveis más práticas por parte dos servidores públicos envolvidos neste processo. Assim como ao Conselho de Ética e Disciplina da Polícia da República de Moçambique nos termos do art. 90 do Decreto n.º84/2014 que aprova o Regulamento Disciplinar da Polícia da República de Moçambique, tem o dever de assegurar a aplicação da justa sanção aos autores morais e materiais destas infracções disciplinares que em muito mancham o bom nome da Polícia.
Já quanto as Ministras da Justiça e do Interior de Moçambique que investiguem estas denúncias e instem as autoridades policiais para o comportamento. “Queremos aqui e agora intimar a Polícia e ao Município para o comportamento e assegurar que os respectivos processos legais entrarão nos próximos dias na Procuradoria. Nossa luta será nas ruas e nos Tribunais e iremos ocupar a cidade porque a ela é nossa”, destacou Quitéria Guirengane.
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